A gente ia por um caminho, quando deu fé, tinha diante de si um pavão: passeava majestoso na grama verde-garrafa, e vendo que chegava assistência, foi desdobrando a cauda, pena por pena, com o gesto de quem soltasse, de uma em uma, um bando de borboletas, cada qual da sua cor.
Pessoa que ia no automóvel a meu lado, vendo o suspiro que eu dava, tirou o pé do acelerador, puxou o freio de mão, e soltou um suspiro também: “Senhor, que bicho bonito!”
Depois, vendo a cobiça no olhar da companheira, ofereceu: “Se quiser, bem, compro um pavão pra você”.
Sorri com tristeza. A vida do homem de hoje é tão mesquinha que, para um de nós, querer possuir um pavão é desejo tão frívolo e impossível quanto querer um cometa. E assim, respondi como pude ao oferecimento: “Não, deixa o pavão no parque. Pavão precisa de parque, e quem tem parque é o governo. Que é que a gente ia fazer com um pavão lá em casa? Só se botasse no galinheiro.”
O pé voltou ao acelerador, o carro tornou a andar, o pavão continuou se exibindo na grama, debaixo do pé de casuarina, de leque aberto e deslizando em passo de noiva.
Falei aquilo por falar, mas só Deus sabe como quis ser dona daquele pavão. Talvez tenha sido a coisa que mais desejei neste mundo. Tão bonito, tão lustroso, tão imperial, com aquela cabeça coroada, o manto de rei de maracatu.
Se eu tivesse um pavão ensinado, saía com ele pela rua, preso por uma fita cor de prata, com um anel dourado na perna. E pintava os pés dele com esmalte magenta, que tem reflexos cor de violeta. Passeava com ele pela praia de Copacabana e fazia o meu pavão ensinado cumprimentar as pessoas conhecidas com um abrir e fechar de cauda, como uma dama com o seu leque de plumas num salão de baile. Punha no meu pavão o nome de Violante.
“Escuta, Violante, lá vem minha amiga dona Julinha no seu maiô cor de sangue”.
Violante raspava o chão com a cauda para a esquerda e para a direita e depois nós dois saíamos, gozando a admiração dos banhistas, e seguidos dum batalhão de moleques como se nós fôssemos banda de música.
Pavão meu ensinado não comia milho nem bichinho do chão. Só comia cigarra, libélula, mosca azul e peixinho dourado de aquário. E quando quisesse grão, comia bago de romã e semente de girassol, que é tão usada nos romances russos.
De noite punha Violante para dormir no pé de laranjeira em flor. Dava banho nele no poço de água gelada, que vem de quatro nascentes.
Fazia papagaio de papel de todas as cores para Violante brincar com eles. Pedia emprestada a arara do nosso amigo Ricardo para Violante namorar. E comprava um álbum para guardar retratos de Violante em todas as poses, em filmes kodachrome.
E por fim, no triste dia em que Violante morresse, enrolava-o numa mortalha de papel celofane, toda debruada de papel de chocolate, esperava a maré rasa, abria uma cova na areia e lá deixava Violante para que o mar o cobrisse.