28 fev 2022
Guilherme Tauil
Eis que Paulo Mendes Campos se torna centenário. O cronista, tradutor e poeta, sobretudo poeta, chegou ao mundo via Minas Gerais, em 28 de fevereiro, numa terça-feira de Carnaval. Sua crônica, inconteste, é merecedora de grandes celebrações. Mas, não sendo possível dedicar mais do que alguns parágrafos ao aniversariante, fica acertado que esta comemoração é apenas um breve sobrevoo em torno de sua prosa – ou melhor, de seus poemas em prosa.
Afinal, Paulo Mendes Campos é o mais poeta dos cronistas. Às vezes, chega até a subverter a pontuação para alcançar certas imagens líricas, quase como se escrevesse em versos. É claro que, depois da sinfonia barulhenta do modernismo, todo cronista pôde se valer dessa saborosa dissolução...15 fev 2022
Guilherme Tauil
Oh, Minas Gerais! Quem te conhece não esquece jamais, diz a canção adotada como hino informal do estado. “Conhecer”, neste caso, certamente significa “visitar”. Mas, se pensarmos na outra acepção do verbo, a de “compreender”, é capaz de reacendermos uma discussão antiga que sempre aparece em nossas letras. De tempos em tempos, alguém se lembra de perguntar o que seria o tal espírito mineiro, esse charme peculiar de uma unidade federativa que não compete às outras 26, e a conversa vai longe, geralmente acompanhada de versos de Drummond, generosas talhadas de queijo e causos bem-humorados.
Em 1992, Otto Lara Resende, natural de São João del-Rei, escreveu um artigo sobre a questão, perguntando-se: Mineiridade existe? Ou...31 jan 2022
Guilherme Tauil
Dentre as Coisas deleitáveis que Paulo Mendes Campos enumerou, além de “arrancar os sapatos depois do baile” e “foto em que a gente fica mais bonito do que é”, está um “cigarro depois do café da manhã, sobretudo de manhã fria, no interior”. O leitor que fuma há de concordar com o cronista. O que não for chegado, bem, esteja avisado de que, hoje, é melhor tapar o nariz e tomar alguma distância para evitar a fumaceira – mas não a ponto de perder de vista essas preciosas crônicas sobre o hábito de fumar.
Sem pedir licença aos antitabagistas, Otto Lara Resende fez o elogio da última tragada em A guimba e o reflexo – aquela que “desce pela árvore brônquica e, perfumada, se infiltra pelas vísceras e acelera o ritmo...14 jan 2022
Guilherme Tauil
Foi na festa de casamento de Di Cavalcanti que Rubem Braga conheceu aquela jovem. “Uma alta e bela moça”, com 20 anos de idade, que pintava autorretratos desde os 14. Por acaso, alguns desses pequenos quadros a óleo estavam no salão e Braga, ao observá-los, foi fisgado pela implacável consciência do tempo. Movido pelo “jogo delicado entre o olhar que vê e o olhar contemplado”, o cronista se pergunta se, assim como a face reproduzida foi se alterando ao longo dos anos, também já não seria outro o modo de ver daquela menina, a “maneira de sentir a si mesma”. Com quase 40, Braga, que se tratava por velho desde moço, desata a projetar nas telas tudo o que ainda aguardava a jovem pintora: pensa nos reflexos “que as luzes...